As veias e o vento (Elaine Guedes)
As veias e o vento (Elaine Guedes)
Nada mais excitante que as árvores balançando,
se dobrando ante o vento
Nada mais movimento e vida
Aqui em minha janela, ali fora, bem perto
Eu assistindo ao balançar tremendo ,
como se fosse num outro universo,
um que não me assiste, não me assiste!
Nada mais excitante que as gotas de chuva no vidro
Elas vieram de tão longe e ficaram grudadas aqui, só pra mim
Eu ,tão desimportante e quieta,
Diante de tanta demonstração de força
O vento está dizendo alguma coisa
Parece a voz de um deus faminto
Se alimentando do gemido das folhas.
Abro a janela e me vem um cheiro de carne frita do vizinho
Vindo junto do perfume da mata que não para
Ignorando-nos tal e qual
Pois que nenhum vizinho está acordado para isto,
Ninguém gosta de assistir o rudeza do tempo
A mim , graças a Deus,
estaria ainda mais a admirar o contorno das montanhas se mexendo
Se curvando ao vento
Não fosse o drástico cheiro de gordura que ainda entra pela janela
Quando tento respirar o ar gelado da frente fria
Atravessando a mata , me lambuzando o rosto.
Deus do céu, como comer dessa fritura?
Como é que em vez de respirar o ar sedento de nossa alma pura
Pode-se se empanturrar as veias com algo tão soturno?
Com que é que nos misturamos diariamente, afinal?